Os Finzi Conti, no Rossio

Este país é tão cruel, estes governantes são tão desavergonhados e amnésicos, que às vezes nos sentimos abençoados por finalmente recuperarmos algo que já considerávamos como perdido (e que, afinal, apenas nos tinha sido retirado). É assim que me sinto quando se fala na recuperação do Cais das Colunas, na Praça do Comércio, ou mesmo na abertura da Praça do Duque de Cadaval, nas traseiras da Estação do Rossio, em Lisboa.

Onde antes havia um parque de estacionamento com arrumadores devidamente licenciados, agora há uma praça reabilitada com esplanadas e alegria. O facto de a maioria dos visitantes ser turista diz o suficiente sobre a tal amnésia ou memória colectiva que se instalou nos lisboetas: ainda que a praça nos tenha sido realmente devolvida, ninguém se sente absolutamente confortável naquele espaço, é como se estivéssemos a usufruir de território sagrado, ou construído sobre um antigo cemitério indígena. Propriedade é roubo, dizia o outro.

Por enquanto, sentados na esplanada da geladaria Finzi Contini, sentimo-nos apenas lisonjeados por finalmente termos recuperado um espaço que, por direito, era nosso. O nome da geladaria, inspirado no livro de Giorgio Bassani e filme de Vittorio de Sica, O Jardim dos Finzi Contini, convida à metáfora, claro: o "jardim" era um oásis onde a aristocracia judaica italiana de Ferrara se escondia dos nazis e fascistas, antes e durante a Segunda Guerra Mundial. Hoje, a geladaria situa-se a dois passos do Hotel Avenida Palace, que albergou a aristocracia europeia exilada no tempo da grande guerra (incluíndo espiões e fazedores de gelados).

www.finzicontini.pt/

www.imdb.com/title/tt0065777/

www.hotelavenidapalace.pt
http://en.wikipedia.org/wiki/Il_giardino_dei_Finzi-Contini