terça-feira, 23 de setembro de 2008

O que nos falta inventar?


É incrível que o homem tenha ido à lua, que exista o GPS ou os google.maps, que seja possível transplantar um coração humano ou recuperar a virilidade com o Viagra. É impressionante que já se construam casas domóticas ou carros híbridos, que a nanotecnologia seja uma realidade presente, que se tenha desenvolvido uma indústria de recolha de células estaminais e que a música não precise de suporte físico para ser ouvida. É notável que o Cristiano Ronaldo marque golos de calcanhar, que tenhamos evoluído para aquilo que hoje somos com as coisas que hoje temos, e que, no entanto, certas coisas elementares ainda estejam por inventar. A saber:

Uma chucha anti-gravitacional que nunca chegue a cair no chão depois de cuspida pelo bebé. Um automóvel familiar amigalhaço que assinale a sua presença quando o seu proprietário não souber onde o deixou estacionado no parque de estacionamento do centro comercial (e cujas chaves assinalem a presença ou mandem sms para telemóvel quando o seu proprietário não souber onde as deixou arrumadas em casa). Um jornal diário escrito sem erros e que assim possa dispensar o Provedor dos Leitores. Se preferível à prova de água e de vento (o jornal, não o Provedor).

Um ice tea com sabor a chá (e não a manga-laranja ou kiwi-maracujá). Batatas fritas que façam bem. Spray com perfume de carro novo que recupere o cheiro original do automóvel no primeiro dia em que o conduzimos. Uma empregada de limpeza que também limpe o pó debaixo da cama e não venha com histórias de subsídios de férias e de Natal. Peúgas de nylon de titânio, para nunca fazerem buracos. Um comando à distância capaz de regular os níveis de volume da conversa e opacidade das pessoas à frente do televisor no dia do derby de futebol. Passadeiras de peões que, quando atravessadas por humanos e animais vertebrados, pulverizem todos os veículos de quatro ou duas rodas em circulação na proximidade (excepto carrinhos de bebés).

Técnicos informáticos que falem a nossa língua. Automóveis com direccção assistida e lugar de estacionamento incluído no porta-bagagens. Pipocas silenciosas ou capazes de silenciar o respectivo deglutidor. Ares condicionados portáteis e individuais, para que cada um tenha a temperatura que deseja. Liberdade enlatada, para cada qual ter o espaço que merece. Telemóveis com polígrafos, para todos percebermos quando é que a conversa do outro lado é tanga.


Uma tabela de audiências que determine quantas pessoas andam a fazer o quê quando não estão a ver televisão. Cigarros que se possam fumar na totalidade dentro da boca (para assim não incomodar ninguém fora dela). Emissões de rádio capazes de nos informar sobre o nome da banda e da música que está a tocar sem termos de esperar pela conversa, o humor ou a pronúncia rachada do animador. Uma página na internet que funcione apenas como espelho, para dar um jeito no cabelo ou ajustar a gravata antes da reunião das 15h00. Um processo químico que permita transformar a mentira, o dislate, a intriga e crónicas como esta em energia barata e auto-sustentável, dedutível nos impostos.

(Crónica do Jornal METRO de 4 de Abril 2008)

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