sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Must See TV: Mad Men

Tento recordar qual das cenas da primeira temporada de Mad Men (em exibição na Fox Next e Meo) mais me terá impressionado, e fico num impasse. Terá sido o momento em que Betty, a solitária esposa suburbana de Don Draper, descobre o gozo que é debruçar-se sobre uma máquina de lavar trepidante? Ou a sequência em que os “(m)ad men” (de Madison Avenue) tentam compreender o sucesso do “carocha” da Volkswagen, marca germânica associada ao nazismo? Inesquecível o diálogo musculado da estreia, onde o protagonista Don Draper, a gerir a campanha da Lucky Strike, conversa sobre vícios de fumo com um empregado negro, que não está autorizado pelo patrão a responder. Nos anos 60, a América “impoluta” iria chegar ao fim – mas a série passa-se antes do fim dos impérios, quando tudo era bonito e as pessoas sabiam qual era “o seu lugar”. Em suma: um delírio saudosista que fará tremendo sucesso entre uma certa classe demodée em Portugal.
A imagem global que guardo de Mad Men é de um quadro idílico inspirado em Edward Hopper ou Norman Rockwell, retratando uma sociedade impecável de reposteiros alinhados, camisas vincadas e comida na mesa. Os homens casados deixam as mulheres em casa, nos arredores, e frequentam as amantes antes, durante ou depois do trabalho em Manhattan. As secretárias serão cortejadas indiscriminadamente, com maior ou menor sucesso, até ao momento da sua epifania (para Peggy Olson, será no fim da primeira temporada). Estamos em 1960, já se fala de Kennedy mas não de revolução sexual. As meninas lêem o proscrito Amante de Lady Chatterley de DH Lawrence, mas ainda não há pílula, portanto também não há poder. O escândalo não é fumar-se no trabalho, na cozinha ou na cama antes de dormir, mas sim uma das vizinhas, mãe de dois filhos e assídua dos comícios de Kennedy, ter decidido divorciar-se. O escândalo é o grupo sexista de criativos ter de admitir a entrada de um elemento feminino nas suas fileiras, apenas porque ela descreveu o resultado de um testing de batons como “um balde cheio de beijinhos” e descobriu que um “massajador feminino” pode ser uma geringonça eléctrica capaz de dar grandes alegrias à mulher solitária.

A cena mais bela de Mad Men é o discurso de apresentação por Don Draper de um novo sistema circular de slides da Kodak aos seus clientes. O modelo ainda não tem nome, mas a descrição sublime do génio publicitário (um homem com um passado obscuro) aponta a uma nostalgia que pensávamos ser irrecuperável. Os clientes ficam de cara à banda, um dos colegas sai da sala a lacrimejar, e fica resumido numa frase profética sobre vitrinismo o espírito da série Mad Men: “a conspicuous lack of clutter” (uma ausência notável de excessos).

5 comentários:

Beta disse...

Há séries que são privilégios só de alguns. Pode ser que daqui a alguns tempos passe na 2.

jota disse...

Dentro do mesmo tema (publicidade), mas num outro registo, aguardo com alguma expectativa a chegada deste filme/documentário:

http://www.oneclub.org/oc/thealchemists/

Não deixem de ver o trailer e ouçam esta frase dita com a voz grave que só muitos anos de tabaco e Bourbon conseguem apurar:

"The frightening thing about being what someone calls a creative person is that you have absolutely no idea where any of your thoughts come from. And, specially, you don’t have any idea about where they’re going to come from tomorrow."

Tivessem-me dito isto há uns anos atrás e o dinheirão que eu não teria poupado em terapia...

Anónimo disse...

As cuecas do Massa são dessa época.

NRC disse...

Atenção - contém spoiler:

Já vou a meio da 2ª série e continuo a achar que o momento alto de Mad Men é a gravidez/parto surpresa de Peggy...

Miguel Somsen disse...

Shhhhhiu!