quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Prada


Publiquei esta crónica no Metro quando estreou Diabo Veste Prada em Portugal (2006, salvo erro). Na altura, a desculpa serviu para falar sobre as diferentes perspectivas que homem e mulher têm em relação a uma ida ao cinema. Acho que o tema (e a perspectiva) não mudou assim tanto. Aqui vai.

Não conheço um homem que tenha gostado da nova comédia de Meryl Streep, O Diabo Veste Prada, nem uma mulher que não tenha gostado. Os homens que conheço são quase todos críticos de cinema e os críticos de cinema não têm dinheiro para vestir Prada (o que os leva a concluir que a moda é um luxo e uma futilidade). As mulheres que gostaram de Diabo Veste Prada são minhas amigas, o que só prova o bom gosto que têm. Logicamente, e tal como eu, elas gostaram de Diabo Veste Prada.

Portanto, o Diabo Veste Prada não é um filme unânime. Como aliás não são unânimes os homens e as mulheres. O que parece evidente é que este é um daqueles filmes que as mulheres tentarão levar os maridos a ver, e os maridos tentarão comprar por engano um bilhete para o novo filme de acção do Kevin Costner.

A natureza diz-me que os homens, sejam eles pacholas da metalo-mecânica ou dândis das belas-artes, vão ao cinema para ser críticos, enquanto as mulheres vão ao cinema para deixar de criticar. O que para eles é extensão, para elas é extinção. Deve ser por isso que os críticos de cinema são quase todos homens. As mulheres, perdoem-me o sexismo, criticam tudo o resto – excepto os filmes. É por isso que adoro ir ao cinema com elas: quando saímos da sessão, só falamos do trânsito.

Para os homens, cinema é coisa séria – por isso eles só vêem filmes “desafiadores”. O que é um filme “desafiador”? Eu próprio não sei, mas imagino logo uma cena de acção que “desafie” as leis da gravidade e não insulte a inteligência do “gajo”. Basta pensar em ficção científica, espionagem ou clássicos de guerra; filmes com o Will Smith, o Matt Damon ou o Tom Cruise. A situação melhorou quando Hollywood tirou Angelina Jolie da cartola – a mulher biónica parece ser boa demais para ser verdade; e mesmo que não seja verdade, ela é boa.

Os filmes “desafiadores” implicam uma certa ciência, e toda a ciência implica um conhecimento”, e nenhum homem assumido sai de casa sem o seu “conhecimento”. O problema é que o sério, como as calças vermelhas ou à boca de sino, já passou de moda. Sério são os intelectuais, e intelectualizar não leva a lado nenhum. Quanto mais, leva uma mulher para a cama, mas isso no dia seguinte vale muito pouco.

Pelo contrário, as comédias, sejam elas de Jim Carrey, Robin Williams ou Adam Sandler, têm mais facilidade em vender a seriedade do mundo (através da subversão). Basta recordar um dos mais acutilantes monólogos de Meryl Streep em Diabo Veste Prada (sobre a influência do cerúleo na moda), para se perceber que aquilo, sim, é um filme com tomates. E realmente, não sendo um filme de homens, Diabo Veste Prada tem tudo no sítio. É maior a minha admiração por perceber que o realizador David Frankel fez tábua rasa do original literário de Lauren Weisberger (o seu livro é uma denúncia entediante da bitchiness de Anna Wintour, editora da Vogue).

No livro, a autora é tão séria como um homem vitimizado. No filme, David Frankel é assumido, desopilante e corajoso. Corajoso como só uma mulher sabe ser (sem ter de admitir); corajoso como um homem gosta de apregoar (sabendo que não é). Como se vê, toda a futilidade tem a sua utilidade.

TVI24: aqui e agora


A pouco mais de 24 horas da estreia e abertura do TVI24, deixo aqui ao lado alguns links do You Tube para as promos de lançamento de canal que temos vindo a preparar e executar ao longo destes últimos dois meses aqui na TVI. Algumas outras promoções estão ou estarão disponíveis noutros links do You Tube ou no canal 7 da grelha da TV Cabo.

Não tem sido fácil, não tem sido simples, não tem sido tranquilo. Mas se fosse fácil não teria piada, se fosse simples haveríamos de complicar e se fosse tranquilo seria facilmente esquecível. Ora a ideia é que tudo isto seja memorável, que dure mais uns dias até chegar a uma semana, quatro semanas, outro mês, uma temporada, duas estações e um ano de vida. E viver as 24 horas como se elas não significassem apenas um dia mas um carnaval e uma vida.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Os vencedores dos Óscares - em 1ª mão!


Conseguem ver? Esta foi a suposta lista falsa com os nomes dos vencedores dos Óscares que apareceu a circular na net ontem.

A Academia diz que a lista é uma fraude. Evidentemente, nunca saberemos. Mas podemos desconfiar: é que a lista é uma aproximação fiel ao que decerto resultará da cerimónia na noite do próximo domingo (em directo na TVI).

Heath Ledger, Mickey Rourke, Kate Winslet, Danny Boyle, Slumdog Millionaire. Só falta conhecer a punchline das piadas sobre o filme Austrália previstas para o apresentador do espectáculo, Hugh Jackman.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Quem quer ser crítico de cinema?


A três dias da entrega dos Óscares de Hollywood, a pergunta que se deveria fazer era: “Quem Quer Ser Bilionário, de Danny Boyle, vai ser o grande vencedor da noite dos Óscares?”. No entanto, a pergunta que mais se ouve por cá é outra: “Quem Quer Ser Bilionário é ou não um bom filme?”. No domingo Quem Quer Ser Bilionário vai decerto ganhar três dos principais prémios da Academia – melhor filme, realizador e argumento adaptado. Mas será isso suficiente para atenuar a discussão que entretanto se criou sobre as qualidades cinematográficas e ideológicas do filme de Danny Boyle? Espero que não.

Não me lembro de alguma vez um filme “unânime” (isto é, favorito dos Óscares) ter dividido tanto aqueles que sobre ele escrevem. Antigamente a crítica estava confinada aos críticos. Tínhamos o Expresso, o Diário de Notícias, o Semanário e mais tarde O Independente e Público. Hoje basta criar um blog para se publicar meia dúzia de disparates sobre cinema – e sobre a respectiva classe crítica. Classe essa que, por não estar sindicalizada, não se pode defender em bloco.

Mas não se pense que a balcanização dos críticos de cinema diminuiu o valor do debate público (e neste caso publicável). Basta ver o que se tem escrito sobre Quem Quer Ser Bilionário nos blogs de Luís Miguel Oliveira (As Aranhas), João Lopes (Sound+Vision) ou Bruno Nogueira (Corpo Dormente) para se perceber que o espectáculo vai continuar – muito depois do filme ganhar os Óscares que tiver de ganhar.

A discussão inflamou esta semana quando Bruno Nogueira, que não é crítico de cinema mas comediante, decidiu criticar os críticos que disseram mal do filme por si adorado – Quem Quer Ser Bilionário. “Ser crítico de cinema só obedece a uma regra básica: dizer mal daquilo que está em alta. Há qualquer coisa de intelectual em contradizer as massas”. Bruno Nogueira falava contra os críticos Luís Miguel Oliveira, do Público, e Vasco Baptista Marques, do Expresso, que arrasaram Quem Quer Ser Bilionário.

No blog Sound+Vision, o sempre esclarecido João Lopes, que já foi crítico do Público e do Expresso, picou o debate. “De que massas está Bruno Nogueira a falar? Das massas que em 1932 deram a vitória ao partido nazi? Das que transformam Quem Quer Ser Milionário num fenómeno de bilheteira? Como é que muitos bilhetes vendidos produzem uma ideia?”.

Bruno Nogueira, que tem razões de sobra para defender a sua “dama”, cometeu um erro: aliou-se às massas. Contra a balcanização, armou-se em Santana Lopes. Ao sugerir que todos os espectadores que fizeram o sucesso de Quem Quer Ser Bilionário (as massas) pensam o filme da mesma maneira, ele está apenas a ofender o livre arbítrio das massas. Pior, está a fazer das massas puré. Ele está mesmo a pedir para lhe darem na cabeça.
(Publicado no Jornal METRO de 20 Fevereiro 2009)

A Praça do Comércio ou o Terreiro de Paço?


Quando a maioria das pessoas não sabe que nome há-de dar a uma das principais praças (ou terreiros) do país, eu acho que já não há grande solução que possa vir a salvar a Praça do Comércio. E o mesmo se pode dizer do Terreiro do Paço.

Há um mês, a Praça fechou para obras de saneamento. Hoje, as obras de saneamento já conseguiram desviar as habitualmente afuniladas linhas de trânsito ascendente e descente, as mesmas que António Costa planeia limitar quando, um dia, as obras finalmente terminarem. “Nove meses”, dizem eles. “Dois anos”, lê-se noutro jornal.

É irrelevante o tempo que mais uma vez se irá perder no terreno: o que sabemos é que a promessa demagógica de devolver a Praça à cidade (e aos 52 lisboetas que nela vivem) virá inevitavelmente alimentar os discursos eleitorais da próxima rentrée. Portanto ou a Praça reabre em Setembro, a tempo das autárquicas, ou fica fechada até 2012, para o deixa-andar do segundo mandato de António Costa.

Pessoalmente, não gosto da Praça do Comércio. E o mesmo se pode dizer do Terreiro do Paço. É verdade que a Praça não existe para agradar ao senhor cronista das sextas feiras no Metro. Mas, por generosidade minha, gostaria de pensar que ela tem um propósito mais abrangente, ou que alguém saberá um dia encontrar a sua razão de ser. Talvez as obras sirvam para definir finalmente a sua personalidade, porque até hoje nada.

Há vinte anos, a minha mãe estacionava ali todos os dias o carro sem dizer água-vai, e limitava-se a deixar uma moeda a quem lhe encontrava um lugar. Depois, o “vergonhoso parque ilegal” passou a ser um “vergonhoso parque oficial”, nunca impedindo o devido caos e a trindade. Desde que tiraram dali os carros, a Praça do Comércio esvaziou-se de conteúdo.

Seria o seu desígnio tornar-se numa espécie de Foz Côa de Lisboa? Os políticos acham que não, e procuram as soluções mais rocambolescas para levantar aquilo do chão: desde a maior árvore de Natal do mundo até às rolotes de António Costa, é um ver-se-te-avias de animação fricolé e plasticidade industrial. Até hoje, a única coisa que a Praça do Comércio nunca conseguiu ter foi genuína vida vivida. E o mesmo se pode dizer do Terreiro do Paço.

No último fim de semana antes das obras, em Janeiro, fui finalmente ao local do crime ver a animação que levava a edilidade a limitar o trânsito rodoviário na zona. Meia dúzia de serviços de pipocas e farturas, umas dezenas de visitantes de circunstância , e a esperada deriva institucional de um pólo de convergência que parece divergir em todos os seus aspectos ideológicos. O que eu preferia é que as actuais obras de saneamento servissem também para sanear todos aqueles que planeiam para a Praça do Comércio um “comércio” que ela não tem. E o mesmo se pode dizer do Terreiro do Paço.

(Publicado no Jornal METRO de 6 Fevereiro 2009)

O Metro do Porto


A única informação relevante que eu tenho para apresentar esta semana é um pedido de desculpas formal pelo modo como tenho tratado os fiéis leitores do jornal Metro no Porto durante estes anos. Do pouco que sei, o Metro tem uma versão lisboeta e outra portuense. Infelizmente, não tem duas versões de cronistas. O que significa que os desgraçados do Porto são obrigados a levar com as graçolas do idiota que aqui escreve às sextas – e escreve repetidamente sobre as coisas mais bizarras que se passam em Lisboa, sejam túneis, graffitis, fórmula 1 na Avenida da Liberdade ou o Santana Lopes à frente da Câmara Municipal.

Acredito que na base do projecto do jornal Metro em Portugal, a ideia fosse convidar intelectuais esclarecidos capazes de escrever com brilhantismo sobre o país e o mundo. Tiveram azar, saí-lhes eu na rifa. Eu não sei nada sobre o país e o mundo que o resto do país e do mundo não saibam já: a terra é plana, o sol gira à volta do meu umbigo e o FC Porto acaba sempre em primeiro lugar. Mas há uma diferença: embora eu viva em Lisboa, vivo perto do primeiro comboio que segue para o Porto. Portanto, sei quase tanto do Porto como de Lisboa. Mas quanto? O suficiente para perceber quando é que estou a ser enganado por um taxista que me leve de Campanhã para o Hotel Infante Sagres através de um “atalho” pelo Campo Alegre via Circunvalação (basta procurar os sinais que dizem “Espanha 30 km” para começar a desconfiar).

O que me chateia nos lisboetas é a sua sedentaridade: mais do que os preconceitos e lugares-comuns, a relação dos lisboetas com o Porto está dependente da indolência de cada um de nós (custa a acreditar que juntos possamos fundar um Movimento). Para os alfacinhas, Cascais é estrangeiro, Vila Franca de Xira é 3º mundo e a margem sul, enfim, “jamais”. O lisboeta vai de carro da Bica para o Incógnito, dez metros mais abaixo, portanto não lhe podemos exigir grande esforço. E, claro, nenhum lisboeta vai ao Porto, nem que o DJ Kitten ou o actor Nuno Lopes façam striptease no Pitch ou Passos Manuel. Para os lisboetas, Porto é estrangeiro, mas não suficientemente estrangeiro para justificar esforço em reservar voo low-cost com três meses de antecedência.

No Porto, todos são da casa – para o melhor e o pior. Na estação de Campanhã, ninguém nos pede autógrafos. O taxista trata-nos com um desdém nacional indiscriminado, sejamos adeptos do Gondomar ou do Benfica. Os portuenses não são nem mais giros, nem mais morenos, nem mais porreiros que os lisboetas. O risco de ser bem recebido no Armazém do Chá é tão grande como o de levar um enxerto de porrada nas Galerias de Paris (apenas porque se pediu autorização à gerência para fotografar o espaço para uma revista de viagens). Portanto, o Porto é igual a Lisboa? Era o que faltava! As miúdas do Porto não são iguais a nada jamais visto (ou jamais visto pelos lisboetas). Mas isso é algo que apenas os leitores do Metro do Porto poderão compreender.

(Publicado no Jornal METRO de 30 de Janeiro 2009)

Má Educação


Deixei de estudar há 16 anos. Decidi que, no dia em que conseguisse fazer a cadeira de Direito Internacional Privado do sofrível curso de Relações Internacionais da Universidade Lusíada, iria tirar férias para sempre. Tenho sido fiel a esse princípio: nunca mais me esforcei para aprender sem amar ou sem ter a curiosidade de saber, e seria talvez uma das piores referências do jornalismo nacional se pudesse ser considerado jornalista (não tenho carteira profissional nem carta de condução de pesados). No dia em que acabei o curso, fiz como Sartre, leitor omnívoro, quando confrontado pela mãe: “O que vai fazer o menino depois de ler esses livros todos?”. Sartre: “Vou vivê-los”.

Vivi os últimos 16 anos com pesadelos de exames e provas por repetir, de orais compulsivas e horários restritivos, e todos estes dias acordei para o sonho que é uma realidade sem escolas e professores, sem modelos de conduta ou bases de moral que não sejam aquelas transmitidas pela poesia vivida da minha família, dos meus amigos ou das minhas mulheres. Aos 10 anos, a minha mãezinha alertou-me: “Agora que chegas ao liceu, prepara-te. Se faltares um dia a uma aula, não terás o professor a ensinar-te a matéria no dia seguinte”. Decidi que seria um bom princípio faltar menos vezes que os professores.

São poucas as memórias que guardo do secundário: talvez uma professora de Inglês que adorava os meus olhos azuis e outra de Físico-Química que vaticinou a minha miopia. Teria sido maior a minha desilusão se a professora de Química tivesse descoberto que a de Inglês era míope? A grande libertação da adolescência foi ter-me permitido questionar a formação em curso. Com 14 anos, a professora de História do Liceu Sebastião e Silva, em Oeiras, decidiu fazer um “texte”. Ainda perguntei a um colega: “Teste não está mal escrito?”. Ele: “Não faças perguntas, responde ao texte”.

Tudo o que sei sobre os limites do mundo aprendi na Escola Princesa Isabel em Oeiras, onde fiz uma primária exemplar. A Princesa Isabel tinha um campo de futebol pelado, um recinto de ginástica no subsolo onde aprendíamos música, e uma pequena tipografia no edifício da infantil. Luxos? Com quatro anos, sujei as mãos de tinta e fiquei predestinado. A partir daí, as minhas duas alternativas para o futuro seriam: a) jornalismo ou b) apanhar chocos com tinta na barra do Tejo. Hoje, a carreira de jornalismo não se descobre como outrora, quando se escrevia a tinta e borrão. Os mais velhos, como eu, recordam-se de como a dactilografia artesanal da máquina de escrever nos sujava os dedos. Agora, com os computadores, o mais perto que a nova geração pode ambicionar é escrever textos que sejam uma nódoa.

(Publicado no Jornal METRO de 23 Janeiro 2009)

Os Serviços

No sábado passado, o sol convidou os lisboetas para a rua mas o frio de Janeiro empurrou-os para dentro dos restaurantes ribeirinhos, com graciosa vista sul e o intacto espelho de água. Não fui excepção. Entrei num desses espaços populares com minha filha e sua mãe. Mas antes de me aburguesar na esplanada, achei delicado informar a “gerência” sobre as minhas intenções. Contei todos os empregados em trânsito, umdoistrêsquatrocincoseissete formiguinhas, e eis-me chegado a um balcão de hiperactividade e destreza profissional.

“Queria uma mesa para dois e um bebé, por favor”. Alguém: “As reservas são aí atrás”. Sendo que o “aí atrás” era a zona de recepção que deveria ter alguém a receber a clientela. Esse alguém, a gerente de sala, não estava presente. Mas uma vez apresentada em serviço rigoroso e tardio, a moça sexy e empinada não serviria os meus propósitos imediatos: “De momento não temos nada!”. E aquelas mesas em baixo? “Ali é a esplanada, não serve refeições, só crepes e tostas mistas!”. Então arranje-me uma mesa na zona de refeições, por favor. “Fumador ou não fumador?”. Não fumador: somos dois adultos e uma bebé, por enquanto só inalamos ópio.

Dez minutos depois, estávamos sentados na última mesa para não-fumadores disponível ao cimo da terra. Ao lado, já na zona de auto-flagelação assumida, um cliente saca de seu charuto e a respectiva névoa invade território vizinho, o nosso. Em suma, a balcanização de espaço num sábado à tarde. Foi então que a mãe exigiu: “Não é possível um homem estar a fumar um charuto ao lado da minha filha, quero outra mesa!”. Pareceu fácil a deslocação da nossa comitiva de uma sala para a outra, mas lamentei os dois pãezinhos de soja que ficaram na mesa. Com eles, terá permanecido no limbo o pedido de dois pratos que dariam imenso jeito a um casal de adultos com apetite. Uma coincidência o facto de a fome, mesmo ao fim de semana, acontecer sempre à hora do almoço.

Uma hora depois, já com a bebé impaciente, o “comer” chegou à mesa. Pior do que uma criança com birras são dois adultos esfomeados e intratáveis, pais de uma criança com birras. Soluções? Guardar tudo num tupperware ou comer rapidamente e pedir à bebé para pagar tudo com o American Express Junior. “Desejam sobremesas?”. Traga-nos um café e a conta. Demorou-se o café e nunca chegou a conta. Até hoje. As formiguinhas não terão compreendido a indolência da solicitação: “Tra-zia-me-a-con-ta-se-faz-fa-vor?”. Deveria ter acrescentado: “Hoje”? A mãe e filha seguiram para a rua, eu desloquei-me ao balcão munido de cartão de crédito, e aguardei, aguardei, aguardei, antes de sair do restaurante sem pagar pelos serviços prestados. Prometo não voltar a fazer uma coisa destas antes da próxima vez que tiver necessidade de fazer uma coisa igual.

(Publicado no Jornal METRO de 16 janeiro 2009)